O Caderno Lilás de Karim Blair

quinta-feira, 3 de novembro de 2011


feroz

Uma paixão feroz no que ela tem de mais forte: a circunstância inequívoca de paixão. Que escorre pelos braços cheios de areia e basalto, e se aloja, imperturbável, nos promontórios sedimentados. Diferente dos dragões dos rios, das lições de caligrafia, das canções francesas, das luzes fortes dos oceanos. Diferente dos meninos com tochas de azeite e malabares, dos taifeiros com a gola das camisetas cerzidas, e dos rostos duros de hematita e lápis-lazúli que vivem em algumas esquinas do porto. A paixão terá outro nome, outra dinastia, outra conseqüência, outra gramática, outra combustão. E será a voragem de um vento de chumbo sobre um bloco de desenho. Afastei Tomás com a mão, as flores vermelhas presas ao substrato marinho e às cápsulas tóxicas. Os naturalistas alemães que pacientemente ilustravam seus livros, os navios fantasmas vagando pela baía de Santos. A filmografia dos desejos, um cibercafé à luz de alguma esquina, uma colagem marroquina. Apenas fiz isso, afastei-o com a mão, a pulseira de berloques e pérolas no pulso sussurrou como sussurram as cordas dissonantes de uma guitarra. A anarquia que precede a arquitetura difícil dos espectros que vão e voltam, e depois vão outra vez.
As microrregiões borradas de lua, as garçonnières, as peças líricas de Grieg, as pontes sobre os canais e debaixo delas as catraias, e em cima delas as grafonolas, um crânio enlameado que a noite encobre, e os peixes dourados das fábulas A saudade é um subterrâneo mapeado com o tato, com nomes vagos e semblantes enevoados.